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DOIS MESTRES, UM APRENDIZ Temos o prazer de informar que, de 26 de junho a 26 de
outubro de 2010, nosso Ateliê, na Barra do Jucu, mostrará
quarenta obras (óleos, acrílicas, aquarelas e desenhos)
de Levino Fanzeres (11), Homero Massena (15) e de minha autoria (14).
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Levino Fanzeres |
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Kleber Galvêas |
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Homero Massena |
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Japonês e Capixaba discutem a implantação
do Parque Siderúrgico na Ponta de Tubarão. Moringa pintada
por Massena (87 anos), usando como pincel um pedaço de Bambu e
tinta do Pedrinho's bar. Barra do Jucu, 1972.
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Levino Fanzeres |
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Kleber Galvêas |
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FANZERES E MASSENA: POLÊMICA?
“Na boca de quem não presta, quem é bom não vale
nada”- Geni Malta, Barra do Jucu.
Em Portugal, Malhôa e Columbano, pintores oitocentistas, ensejam polêmica
entre seus admiradores. A elegância portuguesa mantém o nível
alto: nós aprendemos e a literatura se enriquece. A turma Columbano enaltece
a superação do desenho, criando atmosfera romântica. A turma
Malhôa, a exatidão do desenho, possibilitando registros precisos
do ambiente. Os dois grupos concordam em destacá-los, entre os artistas
portugueses.
Através da coluna do jornalista Mesquita Neto, Massena e Maria Stela
de Novaes travaram polêmica a respeito da escola fundada em Vitória
no princípio do séc.xx, por Carlos Reis. Massena, artista, queria
ver ali uma escola de arte; M. Stela, cientista atenta ao mercado, privilegiava
o aspecto decorativo/utilitário. O sonho do grande pintor, de mesma formação
e respeitado por Fanzeres e Massena, foi breve.
Polêmica muito popular, no Brasil, foi entre Noel Rosa e Wilson Batista.
O primeiro, compositor já respeitado; o segundo, recém chegado
de Campos, deslumbrado com a boemia da Lapa, Rio de Janeiro. CD gravado por
Cristina Buarque e Henrique Cazes, inclui toda a polêmica, 8 músicas.
A perspectiva de Noel era diferente da de Wilson. Ele teve como referência
a “nata” da malandragem; o outro, o malandro folclórico (o
otário). O resultado foi bom para os dois, fizeram uma música
em parceria dedicada a Ceci, mulher que amaram.
Fanzeres (1884-1956), de renome nacional, visitava o boêmio Massena (1885-1974)
em Vila Velha, que recebia também Hélios Selinger, o grande simbolista
brasileiro. Sua casa era generosa. Massena admirava profundamente o trabalho
de Fanzeres, destacando crepúsculos e pinturas históricas. Entretanto
o quadro do colega que mais elogiava era uma paisagem, gênero em que Massena
era mestre: “Senochenes”, tema europeu medalha de ouro na Bélgica,
que está no Palácio Anchieta (rasgada há mais de trinta
anos).
Fanzeres foi Prêmio Nacional de Viagem, Museu Nacional de Belas Artes;
Massena foi Prêmio de Viagem do governo de Minas. Massena fundou a Escola
de Belas Artes do ES; Fanzeres a mais concorrida e produtiva escola livre de
pintura no Brasil, Quinta de Boa Vista/Rio. Fanzeres representou oficialmente
a pintura nacional com exposições individuais promovidas pelo
Governo no exterior; Massena tem obra no Palácio do Governo Francês
e em nossas embaixadas, de Paris e Londres. Fanzeres domina a coleção
do Palácio Domingos Martins - Legislativo; Massena, a do Palácio
Anchieta - Executivo. Fanzeres está representado no Museu Nacional de
Belas Artes; Massena, de Juscelino a Sarney, foi o único pintor brasileiro
com obra na sala da presidência no Palácio do Planalto –
Brasília. Fanzeres pintou “A Partida de Arariboia”, contribuição
dos capixabas às comemorações do centenário da Independência;
Massena o teto do Carlos Gomes, em 1969.
Aqui não há polêmica, só fuxico. Nós temos
pouco interesse pela nossa história e por obras de artistas locais. Poucos
capixabas conhecem estes dois grandes mestres: um, o mais importante pintor
para o Espírito Santo; o outro, o mais importante pintor nascido no Estado.
Se ambos são importantes e têm intenso brilho, embora sejam diferentes,
é caso de estrela dupla de primeira grandeza no cenário artístico
capixaba.
LEMBRANDO DO MESTRE
Homero Massena fez sua última exposição em 1968. Não
havia nenhuma galeria no ES, ela aconteceu na entrada do Carlos Gomes. O teatro
estava caindo aos pedaços. Uma reforma completa foi iniciada logo após
e Massena, convidado para pintar o teto. Ele tinha 84 anos, subiu escadas íngremes
e realizou o trabalho.
Massena revolucionou nossa pintura. Até 1951, data da inauguração
da Escola de Belas Artes do ES, preponderava aqui a escola da Irmã Tereza
Monteiro Novaes, no Colégio do Carmo. Ela estudou pintura com Carlos
Reis em Vitória e acadêmicos famosos no Rio. Foi mestra dedicada
por mais de meio século. Com suas discípulas produziu obras para
culto das igrejas católicas, eventos cívicos e decoração
de residências. Iniciou centenas de capixabas na pintura, uma dessas foi
minha mãe, de quem tenho dois óleos de 1938, para análise
e comparação com os de Massena. A Escola do Carmo era de maneiristas:
o desenho bem acabado e as figuras representadas com contornos bem definidos
recebiam a cor, como complemento. Faziam, na verdade, desenho colorido.
Na escola de Massena a pintura se liberta. O desenho continua a ser feito com
rigor de perspectiva, claro - escuro e definição de espaços.
Perde a sua função de contorno e ganha importância como
estrutura, orientando a cor aplicada com pinceladas soltas, tintas diluídas,
criando veladuras ricas em matizes. É a pintura com suas tintas cozinhadas
na paleta e texturas representando a natureza dos materiais, o movimento, a
luminosidade natural e emoção. Tudo isto com fatura original e
extrema economia, até no tema. O resultado envolvente nos coloca em comunhão
com a natureza capixaba.
Impressionista, ciente das transformações provocadas pela luz
na forma e cor dos objetos, certo de que o branco puro e o preto inexistem na
natureza e de que a linha do horizonte é abstração, Massena
pesquisa ao ar livre, ganhando dimensão como antropofágico.Digerida
a técnica que absorveu nos grandes centros como Rio e Paris, foi capaz
de criar um estilo próprio e inconfundível mesmo para o leigo,
representando nossa natureza com elegância. Diante de uma tela sua, sabemos
onde estamos. A sensibilidade do artista perenizou trechos da nossa terra, nossa
gente, nossos costumes e nos emociona.
Massena viveu de 1885 a 1974: viu nascer a república e o homem pisar
na lua; a evolução dos transportes, do cavalo para os carrões
e aviões; o aparecimento do rádio, TV... Concordava com os futuristas
italianos que consideravam a velocidade como o principal agente de transformação
da vida e estética moderna; desprezava, entretanto, suas considerações
sobre a beleza do som das metralhadoras e a coleção do Louvre.
Via em Mondrian, a expressão mais lúcida da estética moderna
e a pop arte o retrato da sociedade de consumo. “A novidade não
é necessariamente a rejeição do velho. Enxergamos longe
quando observamos de cima de uma base sólida e alta. A evolução
acontece por cruzamentos, mutações são vistosas, mas transitórias
dificilmente deixam descendência”. Romântico como Juscelino,
viu a interação entre sua obra e a arquitetura moderna, quando
ele quis uma tela sua para decorar o gabinete da presidência, no Palácio
do Planalto.
Embora tenha sido fundador, professor e o 1º diretor do CA da Ufes, nossa
Universidade esqueceu o artista. Nós capixabas, depositários da
pintura mais antiga exposta nas Américas (Convento da Penha) e da pintura
mais antiga feita no Brasil (Reis Magos), passamos a ter com Massena uma escola
de pintura, a sétima no Brasil. Rever a sua obra, na hora em que acontecem
profundas transformações na paisagem e estilo de vida dos capixabas,
pode nos proporcionar reflexões muito interessantes, para ajudarmos a
construir o futuro.
Vídeos:
MASSENA
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FANZERES