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QUERO ESCREVER PARA SER ENTENDIDO.

Tarefa muito difícil para um pintor.

Em 1966 (ano da minha primeira exposição de pinturas) o meu primeiro texto foi publicado em jornal de grande circulação. Para minha surpresa, Samuel e Glecy Coutinho colocaram-no (após correções) em meia-página da contracapa do suplemento infantil “A Gazetinha”. Já havia publicado alguns artigos em “O Pioneiro”, jornal impresso do Grêmio Estudantil do Colégio Marista, Vila Velha. Desde criança já pintava, influenciado por minha mãe Esther, ex-aluna da Ir. Tereza no Colégio do Carmo de Vitória. Enquanto dava minhas pinceladas na tela, ideias que julgava interessantes e originais fermentavam na minha cabeça. Algumas delas eu percebia que transmitiria melhor escrevendo e não pintando. Adulto, fui convidado por Vitorina Gonçalves e Paulo DePaula  a escrever, sobre arte local, na primeira página aos domingos do Caderno de Cultura de “A Tribuna”. Colegas atuantes foram lembrados e mestres pintores homenageados. Esses dois professores, fazendo a revisão dos meus textos, me ensinaram alguns “cacoetes” saudáveis de como escrever para jornal. Ajudaram a “adoçar” as minhas palavras, a ser sutil, a polir as arestas das ideias agudas e cortantes, que eu julgava eficientes. Hoje, maduro, ouso continuar a escrever e a espalhar meus textos, por jornais e pela Internet. Adoro receber feedback. Isso me estimula a aprender, a melhorar na clareza e, assim, alcançar mais pessoas. Objetivo de todo pretenso artista.

Sou pintor. Sei perfeitamente quando termino uma pintura e ela me satisfaz. Escrevendo, consciente das minhas limitações, nunca acho que cheguei a um bom termo. Isso se comprova pelas diferentes interpretações expressas em algumas respostas de generosos leitores, que colaboram criticando.

Costumo comparar a evolução do meu exercício de escrever, de colocar uma ideia na forma escrita, a três pedras diferentes que lanço, em tempos distintos, na água de um lago calmo ou de uma praia mansa.

              Se a primeira pedra que é informe (escrita primária) for jogada para cima, de qualquer jeito, sem cuidado ao fazer o lançamento, caindo, espalha água sem muita graça. Os respingos confusos saltam para todos os lados, e a pedra pode fazer barulho e provocar ondas, mas logo afunda. A ideia que se quer transmitir, mal executada na escrita, vai junto. Ela fez ondas que partiram de um ponto comum e se propagaram de modo semelhante, mas sem efeito prático, como no movimento ondulatório, não transportaram matéria, a ideia mal elaborada fica estacionada.

             Se a segunda pedra, que é estreita e pontiaguda (escrita agressiva), é atirada para baixo na vertical e com força, ela fere a água e afunda rapidamente. Embora faça barulho e crie ondas, quase não percebemos o objeto que causou o evento. O texto agressivo chocou, propiciou desvio de atenção, e muitos interromperam a leitura no início, porque gerou antipatia. O autor é rotulado, posto em um armário, e a ideia é abafada. Texto assim causa desconforto, é ignorado, pouco lido, logo esquecido. 

Quando, ao escrever, se pede ajuda ao Professor José Augusto Carvalho, que tem visão de águia, mestre absoluto da norma culta, nosso maior gramático, autor da “Gramática Superior da Língua Portuguesa”, lançada em Brasília na Embaixada de Portugal, a gente está tentando fazer bacana: ser universal, ir longe; dar tempo para a apreciação, ponto por ponto; chegar claro ao leitor, e comemorar o entendimento. É como lançar a terceira pedra, cuidadosamente escolhida (escrita bem executada), quase um disco, arremessada na horizontal com técnica e força. Assim, ela segue para longe, saltando sobre a água (epostracismo), faz um desenho bonito no percurso, finaliza com aquaplanagem, e desacelerada afunda oscilando, como se estivesse bailando, comemorando o bem feito, suavemente. Tomando-se  esse cuidado ao escrever, o número de leitores que compreenderão a ideia, “pintada com fina fatura” na forma escrita, fica muito maior. Eles compartilham, multiplicam, e o autor fica feliz, pois não existe arte sem público.

Esta é minha homenagem ao mestre generoso, até com quem invade a sua praia. Que paciente nos ensina. Muito obrigado. 

Kleber Galvêas, pintor. Tel. (27) 3244 7115 www.galveas.com novembro/2018  


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